sexta-feira, 29 de agosto de 2008

Contribuição de Fábio Alexandrino

Numa noite
O seu olhar era coisa fria – brasa apagada (o fogo pra sempre extinto) esquecida no meio da rua, à espera da chuva que o céu prometia. Lição de História Em 1959, meu avô (homem de pedra e Lei, a alma de chumbo) esconjurava os de barba e toda a Revolução de Cuba. Hoje, meu pai, ouriçado de tanta indignação, mas com o olho cego dos homens de seu tempo, esconjura os atuais políticos e a corrupção. Fábio Alexandrino é natural de Feira de Santana, formando em Letras pela Universidade Estadual de Feira de Santana, professor de Língua Portuguesa, Redação e Literaturas. É leitor, sobretudo, de Guimarães Rosa e Graciliano Ramos (ficção nacional) e de Manuel Bandeira, Carlos Drummond de Andrade e João Cabral de M. Neto (poesia brasileira). Entre as leituras e o constante trabalho, escreve poesia boa. E-mail: fabioredacao@hotmail.com
Imagem: Estátua de Carlos Drummond de Andrade, in Rio de Janeiro, Brasil.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Boemia pós-moderna

96 diz a 00:01:

... já vivi sim aventuras, e isso, às vezes, não é nada bom porque traz contraventuras.

69 diz a 00:02:

E...?

96 diz a 00:04:

E não espero nada muito sólido, mas estou querendo viver algo melhor... e curtir essa vida em paz.

69 diz a 00:05

Ker ser fliz então...

96 diz a 00:07:

Sim... por que não? trabalhar, ter algum dinheiro... pegar umas baladas, final de semana, não é ruim.

69 diz a 00:08

E o q mais?

96 diz a 00:10:

Beber um pouco de vinho, fumar um cigarro, estar na boemia pra não cair na monotonia da vida... fazer sexo pra não esquecer o prazer que a carne produz nem se acostumar com sua falta...

69 diz a 00:13:

Ainda ñ me respondeu...

96 diz a 00:14:

O que? Eu adoro andar de bicicleta perto da praia no final da tarde. É bom pra exercitar os joelhos...você já fez isso?

69 diz a 00:15:

Fala porra, o que vc curte?

96 diz a 00:16:

Eu? Eu curto a vida à sua medida...a vida, caralho, a vida!

69 sai da sala a 00:20...

jr

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Promessa insana

Quando eu era criança, nem todas as promessas me eram cumpridas, eu vivi sem elas até hoje e não morri; agora adulto ouço todo tipo de juramento, e até me fazem prometer; não prometo que em tudo ao meu amor serei atento porque eu erro às vezes e isso me incomoda tanto...mas não me faz infeliz.

jr

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Happy Birthday, my love!



Aug 5th, 2008

My Love's Day


"I dedicate this rose to my love!"


jr

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Diálogo ingênuo

Diálogo ingênuo


Estava eu a dormir faz algum tempo quando, de repente, senti uma forte dor. Senti um calafrio percorrendo a coluna como se fosse uma injeção de ar. Era a dor da morte! Mas não durou muito tempo, a injeção era mesmo de ar e tinha função anestésica. A sensação era outra: sentia-me como se fosse o próprio padre paranaense Adelir Carli, que desapareceu preso aos mil balões. Todavia, era a sensação de leveza sem nenhum adereço à moda Carmem Miranda.

A princípio, imaginei que estivesse em ares brasileiros. A surpresa era a de Cabral; a vista, colombiana, ambas adaptadas à modernidade. Não era a América, era um paraíso. Cheguei a essa constatação quando comecei a notar que estava aterrissando num lugar muito longe, nunca dantes visitado. Nesse instante, senti meu próprio peso.

Na superfície de um lugar, que vou chamar de chão por não saber o nome, dei uma olhada 360 e vi que tudo estava quase perfeito pra mim. Quase perfeito! Faltava apenas uma coisa: alguém com quem deveria dividir aquele lugar.

Quando pensei em me deslocar, ouvi um ser puro, diferente de todos os seres que já vi em vida. Era Deus, só podia ser. O diabo não poderia ser tão bom!

“Alguma coisa, minha criatura?”

Não consegui falar uma única palavra, estava sentindo um misto de felicidade com alegria... algo inexplicável!

“Não, não... está tudo bem” – respondi.

Minha consciência parecia estar fora de mim, era como se existisse um eu e uma outra pessoa num mesmo corpo. Logo percebi que havia cometido dois pecados: o primeiro se estabeleceu quando disse “não”, a palavra proferida a Ele era negativa; o segundo pecado foi mentir para Deus. Ele sabia que eu precisava de algo. Voltei atrás:

“Sim, meu senhor, eu preciso de alguém para compartilhar este belo lugar. É tudo com que sonhei, e não posso viver tudo isso sem nenhuma companhia.”

“Isso não é possível, criatura amada. Tudo que há aqui é completo e foi feito conforme seus pedidos quando estava lá embaixo.”

“Lá embaixo? Então aqui é o céu?”

“Não, o céu está lá embaixo. Lá está a minha casa, a nossa casa. Aqui está o mundo que pediu só para você.”

“Mas não há com quem possa viver, sorrir, ter filhos, meu Deus.”

Não precisareis de filhos, vós sois as minhas criaturas...

“Disse vós? Mas eu aqui estou só!”

“Sim, aqui você está só porque criei mundos perfeitos conforme você e tantos outros andavam me pedindo. Vejo que já não está satisfeito. Ali está uma porta, criatura, ela dá acesso para o mundo de lá, o mundo coletivo. Se escolher ir para lá, poderá voltar somente uma vez, isso vai depender de sua consciência.”

Minha consciência alertava-me para não questionar a Deus, não desobedecer a Deus, não tirá-lo do sério. Mas eu não podia aceitar.

“De novo não. Você fez o mesmo com Adão e Eva. Não posso escolher, não entro nesse seu jogo”.

Nesse momento eu e minha consciência estávamos falando a sós. Deus havia partido.

Comecei a me acostumar com aquela vida, uma vida quase perfeita. Eu não tinha a noção de tempo como antes. Tudo parecia nada, e nada era o meu sentimento de angústia por saber que estava só. Minha consciência não era uma fantasia, muito menos uma companhia física.

Dirigi-me até a porta e cheguei a pensar duas vezes antes de por o pé do outro lado. Ao me dar conta, já estava lá no meio da sociedade. Andava devagar a fim de perceber com perspicácia cada detalhe daquele novo mundo. Não sentia sede, não tive fome até então, meus desejos haviam-se apagado dentro de mim, sentia-me um espírito puro. Não queria mais ter filhos, não precisava de amigos, não sentia falta de companhias. Eu era simplesmente um ser sem vontades e não sentia falta da vontade, sabia que ali nada me faltava.

As pessoas que viviam naquele mundo falavam todas as línguas que se possa imaginar, e inclusive comigo... e eu as compreendia sem nenhuma dificuldade. Todas as pessoas eram iguais a mim. A vida era uma monotonia, mas não era ruim porque tudo estava em seu devido lugar.

Eu tinha tudo que precisasse e não pagava nada por isso, o dinheiro perdera sua função. Por um instante, pensei até que estivesse de volta a terra, porém a milhares de anos de quando havia sentido a dor da morte. Os homens haviam-se evoluído e pareciam imortais. As pessoas se amavam e não mentiam umas para as outras. Inteligência já não era um valor de distinção entre elas porque em nada se podia comparar...Não havia poder porque o poder estava nas mãos de todos.

Andei mais um pouco por entre os vales e rochedos...sim...havia rochedos e jardins bem preservados compondo a paisagem, e a cidade com suas casas luxuosos preservando arquiteturas medievais. A visão era esplêndida! As relações entre os povos eram diferentes das de outrora. Só existia apenas uma família e ninguém brigava, não havia por que brigar. Não havia mentira porque não havia verdade e não havia verdade porque não havia mentira.

Minha consciência me fez refletir por um milésimo de segundo quando me levou a perguntar a mim: há aqui alguma religião? Eu não sabia ao certo o que era religião, muito menos para que servia. Minha consciência até tentou me explicar que religião tinha o objetivo de “unir as pessoas novamente através de um líder maior”. Mas eu não entendia já que as pessoas ali nunca haviam sido desunidas. Todos ali viviam na eternidade e de nada reclamavam. Os homens e mulheres nada criavam para vender porque sabiam que os outros podiam criar também. As invenções que se conhecem hoje já não faziam sentido no mundo coletivo, já que todos ali se utilizavam apenas do necessário e não sabiam enganar o próximo.

Logo notei que não existia nenhuma criança, nenhum idoso porque ninguém nascia, ninguém envelhecia muito menos tinha que morrer. Aí minha consciência me colocou de prova diante de um tempo criado pela minha cabeça. Minha consciência nada mais era que o resquício de um passado do qual não havia me desprendido de vez. Minha consciência era a minha memória e o meu maior pecado juntos. Quando olhei para trás, avistei a porta pela qual tive acesso àquele mundo. Comecei a voltar e a me recordar de cada passo dado, das colinas, das cachoeiras, do campo, das flores, dos pássaros, pessoas sorrindo inocentemente, os castelos medievais, os animais, o ar puro, a conversa com Deus, a última palavra dirigida a Ele: “jogo”. Lembrei-me também dos meus dois pecados. Enfim, parei no meio da porta e tive dúvidas: não sabia se voltava para o mundo coletivo e monótono ou se entrava no meu mundo quase completo, e isolado. Na minha triste indecisão, ainda vi Deus olhando para mim e balançando a cabeça como se tivesse a dizer: “Minha criatura, nem eu te entendo.”

Acordei com meu cachorro lambendo a minha boca, e eu já não sentia a dor da morte como antes.

By J. Ribeiro


sábado, 2 de agosto de 2008

No meio do caminho há uma pedra para ser tirada

Andei pensando: não vale a pena parar no meio do caminho simplesmente quando há algumas pedras espalhadas. Elas podem até servir de limites, mas o mais agradável é poder olhar por cima dos ombros e perceber como vão ficando pequenas até desaparecerem ao longe.

Essa reflexão pode parecer meio fútil e vazia, porém nasceu da própria condição deste blog. A última vez que postei aqui foi a cinco de janeiro deste ano. Passaram-se exatos cinco meses e vinte e sete dias. Quase seis meses! Durante esse tempo, perdi muito por não ter lido excelentes textos publicados por amigos brasileiros e estrangeiros em seus respectivos sitios. Eis uma lacuna irreparável... peço-lhes desculpas pela ausência. Por outro lado, diversas foram as razões que me levaram a não postar aqui neste período, mas vejo que não vale a pena citá-las. Confesso que a preguiça foi uma delas!

Hoje, ao ler por duas vezes o poema No meio do caminho, do célebre Carlos Drummond de Andrade, só me veio à mente o estado enfermo do Palatus et Colirius. Tinha que retirar a pedra do seu caminho e voltar a postar. Então, para retomar essa nova ‘era’, nada mais justo que começar com a simples (e nunca ingênua) obra de arte do poeta itabirense. É mais um Colirius para curar cegueiras.

No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no mei do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

(Fonte:www.algumapoesia.com.br/drummond)