terça-feira, 19 de junho de 2007

Colírio do mês



Miragem

Vejo teu corpo desenhado
Submerso no lençol
Como a estátua de um deus
E não mais és meu
Sobre o teu ombro guardei
Meus beijos, meus sonhos
Meus risos e suspiros
Desatino, enganos meus?
Ontem mesmo, à noite
Entre meus seios sedentos
Semeaste alento
Em meus músculos suaves
Enterraste o desejo
Hoje sei:
Não mais és meu
E em teus olhos
Amanhecidos
Não mais me vejo

Pensamentos vãos

Vagando vão
Visitar a cada porto-ilusão
Para além de um dia
Vida súbita
Renascente
Em dúvidas
São os versos pagãos
Consolo sublime
Despertar com palavras doces
Ressonar em lembranças lúgubres
Como ondas golpeiam a praia
Pensamentos vãos
Vem e vão

Ivana Patrícia Lima de Oliveira (1981) é natural de Feira de Santana, BA. Cursa graduação em Letras (Português/Espanhol) pela Universidade Estadual de Feira de Santana. Desenvolve ensino de língua espanhola para estudantes de rede pública de ensino em Feira de Santana através do Projeto Portal/Núcleo de Estudos Canadenses e leciona esta mesma língua para crianças de educação infantil em escola privada em Feira de Santana. A amante da literatura costuma escrever contos e poesia sempre nas duas línguas pelas quais se diz apaixonada.

Palavras e Colirius
Quando ocorreu seu primeiro contato com a leitura?

Ivana Oliveira
Aos seis anos de idade tive uma experiência bem marcante. Pode não ter sido a primeira, mas foi a primeira significativa. Eu fiz uma malcriaçãozinha e comecei a gritar que queria morrer, minha mãe me colocou de castigo no quarto e me deu uma Bíblia infantil toda ilustrada. Mandou ler o capítulo em que Jesus dizia "deixai vir a mim as criancinhas porque delas é o reino dos céus". Meu Deus, quanta contradição! - pensei depois de ouvir um baita sermão sobre “é pecado querer morrer'”. Ela me vinha logo com Cristo dizendo "deixai vir a mim as criancinhas...". Mas logo um outro capítulo me chamou a atenção: era a parábola do pobre Lázaro. Se tomarmos a sério a situação, veremos que o gosto pela leitura nasceu de um castigo pelo desejo de morte. E apesar de todo o esforço da minha mãe, eu não me tornei uma religiosa, porém a leitura me conquistou desde o momento do castigo que acabou virando um presente...

PC
Qual a importância da leitura para sua vida pessoal, intelectual, profissional?

IO
É muito mais de que pregam algumas campanhas. A leitura não significa apenas um meio de adquirir conhecimentos para o mercado de trabalho e nem é tão somente "uma viagem"... Hoje eu compreendo muito melhor a função da leitura em minha vida, a consciência de que o leitor não é um mero “viajante”. Ele pode ser um "co-autor". Isso me faz perceber que a leitura cumpre o papel de provocar o meu lado criativo, intuitivo, dedutivo, e isso é muito mais do que preencher uma lacuna em minha vida. É dar a ela o que só mesmo os seres dotados de racionalidade são capazes de compreender e de necessitar. Já que se fala em vida profissional, o fato de ser professora dispensa comentários sobre a importância da leitura, verdade?

PC Quais escritores você mantém na cabeceira da cama?

IO Machado de Assis, Clarice Lispector, Julio Cortázar, Antônio Carlos Viana, Octavio Paz, Pablo Neruda, Jorge Amado, Guimarães Rosa, Castro Alves, Cruz e Sousa, Augusto dos Anjos, João Ubaldo Ribeiro, Cecília Meireles, entre outros.

PC
Por que você escreve?

IO
Acredito que é pelo mesmo motivo pelo qual as pessoas desejam ter filhos, eu, como disse Bras Cubas "não transmiti a nenhuma criatura o legado da miséria humana", então sigo escrevendo... Perdão! Foi apenas uma tentativa de dar uma resposta espirituosa. A verdade é que para escritores de pequeno porte, não cabe tamanha vaidade. No fundo o que me impulsiona a escrever é uma necessidade de recriar o mundo tal como o sentimos: através da fragilidade das palavras, por puro deleite. Antes eu queimava tudo o que escrevia e nunca mostrava a ninguém, até que um dia mostrei uns poemas a um professor e ele me encorajou a compartilhar o que escrevia com outras pessoas.

PC
Você tem algum propósito com a prática da escrita literária para o futuro?

Não sei se há "grandes propósitos", não tenho grandes pretensões quanto a isso. Apenas escrevo quando tenho vontade Se um dia eu publicar um livro será por conseqüência de algo que aconteceu naturalmente. Não quero planejar algo que deve nascer espontaneamente.

Um comentário:

Palatus disse...

Cara Ivana,

Acho que você já carrega uma linguagem de escritores. Suas palavras me lembram trechos de prosa poética...Obrigado!
nilson